Embora haja uma tendência da eletrificação dos acionamentos mecânicos do preparo de cana e, de moendas nas usinas de açúcar & álcool, é sabido que mais de 70% das unidades produtoras do país, algo em torno de 300 usinas, fazem uso de turbinas à vapor para acionamento dos equipamentos utilizados nessa parte do processo industrial, sendo que 35% destas unidades ainda utilizam turbinas controladas por Regulador de Velocidade Mecânico, ou seja, em torno de 105 unidades.

Esse artigo destina-se explicitar a importância e, vantagens da migração do Controle de Velocidade do tipo mecânico para eletrônico-hidráulico, ressaltando que trata-se de uma modernização de baixíssimo custo, de excelente retorno produtivo e, uma alternativa técnica-econômica muito em conta se comparado ao investimento milionário de uma eletrificação dos acionamentos mecânicos.

 

Introdução

As primeiras experiências com Regulador de Velocidade Eletrônico-Hidráulico em turbinas à vapor que acionavam o preparo de cana e, moendas no Brasil datam da década de 70. Estas experiências iniciaram-se em turbinas à vapor da antiga fabricante Zanini, as turbinas ATLAS, muito populares no setor sucro-alcooleiro. Eram empregados na ocasião Reguladores Eletrônico-Analógicos, com acionamento Eletro-Hidráulico Integral.

Foi uma revolução na época, uma mudança de paradigma, pois a qualidade do controle propiciava uma resposta mais precisa e, adequada as intensas variações de carga, uma maior estabilidade na rotação da turbina, elevando a velocidade média da esteira de cana, menos embuchamento da moenda, redução de esforços nos acoplamentos mecânicos ( turbina-redutor- equipamento acionado ), redução do consumo de vapor, entre outros benefícios.

Figura 1 – Exemplo de Regulador Mecânico NEMA-A usado em turbinas à vapor de acionamento mecânico (desfibrador, picador, moenda, etc.) – Trata-se de um controle PID Mecânico puramente proporcional (somente o ganho é ajustável), isto é, trabalha apenas no modo Droop
Figura 1 – Exemplo de Regulador Mecânico NEMA-A usado em turbinas à vapor de acionamento mecânico (desfibrador, picador, moenda, etc.) – Trata-se de um controle PID Mecânico puramente proporcional (somente o ganho é ajustável), isto é, trabalha apenas no modo Droop

 

Figura 2 - Conjunto Regulador de Velocidade Eletrônico-Analógico NEMA-D e, seu respectivo Atuador Eletro-Hidráulico Integral, empregado nas turbinas ATLAS na década de 70 – Controle PID Eletrônico-Analógico Proporcional-Integral (ganho e, estabilidade ajustáveis), isto é, trabalha em Droop mas também em Isócrono
Figura 2 – Conjunto Regulador de Velocidade Eletrônico-Analógico NEMA-D e, seu respectivo Atuador Eletro-Hidráulico Integral, empregado nas turbinas ATLAS na década de 70 – Controle PID Eletrônico-Analógico Proporcional-Integral (ganho e, estabilidade ajustáveis), isto é, trabalha em Droop mas também em Isócrono

 

Diferenças Básicas entre os Tipos de Controle

De maneira geral, a diferença entre o controle mecânico e eletrônico-hidráulico consiste em 2 pontos:

1° Ponto: A ação de controle típica do Regulador Mecânico é um PID puramente P ( somente o ganho proporcional é ajustável ) e, do Regulador Eletrônico-Hidráulico a ação de controle PID permite o ajuste de todas as variáveis (Ganho Proporcional, Integral e, Derivativo)

2° Ponto: A classe de precisão do controle: O Regulador Mecânico geralmente é NEMA A, isto é, a classe precisão no controle de rotação é igual à 0,75% da Rotação Nominal, enquanto que no Regulador Eletrônico-Hidráulico a classe de precisão no controle de rotação é igual à 0,25% da rotação nominal, portanto, muito mais preciso.

Estas diferenças acima é que permitem alcançar precisão de controle superiores e, respostas extramente mais adequadas as variações de carga, entre outros benefícios elencados mais a frente neste artigo.

Figura 3 - Comportamento típico do Controle Mecânico – Ação de controle PID, onde somente a variável P (proporcional) é ajustável
Figura 3 – Comportamento típico do Controle Mecânico – Ação de controle PID, onde somente a variável P (proporcional) é ajustável

 

Figura 4 - Comportamento típico do Controle Eletrônico-Hidráulico - Ação de controle PID, onde todas as variáveis (proporcional-integral-derivativo) são ajustáveis
Figura 4 – Comportamento típico do Controle Eletrônico-Hidráulico – Ação de controle PID, onde todas as variáveis (proporcional-integral-derivativo) são ajustáveis

 

Figura 5 - Tabela da Norma NEMA – Graus de Precisão em Controle de Velocidade
Figura 5 – Tabela da Norma NEMA – Graus de Precisão em Controle de Velocidade

 

Figura 6 - Comparação dos Circuitos Mecânicos versus Eletrônico-Hidráulico
Figura 6 – Comparação dos Circuitos Mecânicos versus Eletrônico-Hidráulico

 

Figura 7 - Tabela Comparativa (Resumo)
Figura 7 – Tabela Comparativa (Resumo)

 

Tempo de Estabilidade, Nível de Oscilação e, Energia de Recuperação

Na figura abaixo (figura 8) um resumo didático, que demonstra o comportamento dos tipos de controle, quando alguma carga é adicionada. Fica claro que o controle eletrônico-hidráulico NEMA D possui parametros otimizados de oscilação e, estabilização, sem falar que a energia de recuperação demandada é menor.

Figura 8 - Comparação dos tempos de estabilização, nível de oscilação e, energia de recuperação, quando da entrada de carga no sistema (carga no eixo da turbina)
Figura 8 – Comparação dos tempos de estabilização, nível de oscilação e, energia de recuperação, quando da entrada de carga no sistema (carga no eixo da turbina)

Um ponto importante a frisar é que a substituição do controle mecânico por eletrônico-hidráulico não altera o rendimento ( % ) da máquina motriz, no entanto, é possível afirmar que haverá um melhor aproveitamento da energia de recuperação do sistema.

Embora não muito usual, pois requer um pouco de trabalho, é possível estimar, através de ensaios de campo e, simulações matemáticas no Matlab, o resultado final-teórico aproximado da energia de recuperação economizada pela troca do Regulador Mecânico pelo Regulador Eletrônico-Hidráulico.

Figura 9 - Exemplo real de ganhos no ajuste de dinâmica em Regulador de Velocidade Eletrônico-Hidráulico NEMA D em 3 momentos distintos
Figura 9 – Exemplo real de ganhos no ajuste de dinâmica em Regulador de Velocidade Eletrônico-Hidráulico NEMA D em 3 momentos distintos. Observar que a Energia de Recuperação (Er) para os 3 momentos são diferentes para a mesma carga.
Em resumo: Er3 < Er2 < Er1

 

Resumo dos Benefícios de uso do Regulador de Velocidade Eletrônico-Hidráulico NEMA D

No preparo de cana:

  • Aumento da velocidade media da esteira, elevando a produtividade / hora;
  • Menor consumo de vapor (energia de recuperação), gerando economia;
  • Redução de esforços nos acoplamentos (turbina x redutor x equipamento acionado), por conta da estabilidade de rotação versus variação de carga, reduzindo o índice de quebras e, manutenção, reduzindo custos;
  • Estabilidade da força centrifuga, beneficiando os equipamentos oscilantes (facas e, navalhas), através da preservação e, não-redução do raio de alcance destes acessórios, por conta da estabilidade rotação, melhorando o preparo da matéria-prima a ser esmagada na moenda, melhorando o índice de extração %;
  • Redução do índice de desarmes da esteira, elevando a produtividade e, reduzindo paradas;
  • Opção de TRIP adicional para sobre-velocidade;
  • Maior estabilidade na linha de vapor da caldeira, reduzindo paradas;
  • Integração com a Automação (COI) em topologia mestre-escravo, otimizando a operação, reduzindo a intervenção humana e, ampliando o automatismo do sistema.

 

Figura 10 - Exemplo real na prática, com pequenas variações entre casos, do efeito na velocidade teórica da esteira de cana em 2 momentos (antes & depois)
Figura 10 – Exemplo real na prática, com pequenas variações entre casos, do efeito na velocidade teórica da esteira de cana em 2 momentos (antes & depois)

 

Na moenda:

  • Controle automático de processo (PV), pelo nível de colchão de cana ou outra variável;
  • Sincronização de rolos de moenda (Turbina versus Motor / Regulador versus Inversor);
  • Redução de esforços nos acoplamentos (turbina x redutor x equipamento acionado), por conta da estabilidade de rotação versus variação de carga, reduzindo o índice de quebras e, manutenção, reduzindo custos;
  • Redução dos índices de embuchamento da moenda, por conta das respostas mais precisas e, adequadas as variações de carga, elevando a produtividade e, reduzindo paradas;
  • Menor consumo de vapor (energia de recuperação), gerando economia;
  • Opção de TRIP adicional para sobre-velocidade;
  • Maior estabilidade na linha de vapor da caldeira, reduzindo paradas;
  • Integração com a Automação (COI) em topologia mestre-escravo, otimizando a operação, reduzindo a intervenção humana e, ampliando o automatismo do sistema.

 

Figura 11 - Exemplo prático de Regulador Eletrônico-Hidráulico NEMA D em moenda açucareira, integrado ao COI local – Elevados índices de rendimento e extração
Figura 11 – Exemplo prático de Regulador Eletrônico-Hidráulico NEMA D em moenda açucareira, integrado ao COI local – Elevados índices de rendimento e extração

 

Figura 12 - Exemplo de Regulador Eletrônico-Hidráulico típico já usado no segmento (preparo & moenda), em aproximadamente 200 unidades sucro-alcooleiras pelo Brasil
Figura 12 – Exemplo de Regulador Eletrônico-Hidráulico típico já usado no segmento (preparo & moenda), em aproximadamente 200 unidades sucro-alcooleiras pelo Brasil

 

Figura 13 - Topologia de Automação Mestre-Escravo
Figura 13 – Topologia de Automação Mestre-Escravo

 

Figura 14 - Topologia de Automação Mestre-Escravo (Expandido)
Figura 14 – Topologia de Automação Mestre-Escravo (Expandido)

 

Conclusão

Por fim, fica provado os elevados benefícios na migração da estratégia de controle, através de um custo muito acessível, que pode propiciar uma aumento de produtividade muito significativo em um segmento onde a palavra RENDIMENTO se torna cada dia mais importante para garantir a sobrevivência do negócio.

 

Referências Bibliográficas

  1. Woodward PID – Equations and Diagrams – Application Note 51433 – Woodward Governor Company
  2. PEAK-150 – Digital Turbine Control – Manual 85565C – Woodward Governor Company
  3. CPC II – Current to Pressure Converter for Turbines – Manual 26448D – Woodward Governor Company

 

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Perfil Profissional: Engenheiro brasileiro de Automação & Controle, com 21 anos de experiência, nascido e, residente em Campinas-SP. Possui também formação técnica em Eletrotécnica e, Instrumentação & Controle. . Atua no ramo de automação industrial desde 1996, tendo trabalhado neste período nas empresas Grantécnica ( área técnica e, produção ), Altus ( assistência técnica e, engenharia ) e, Woodward ( área comercial e, projetos ). . Especialista em automação e, instrumentação industrial de máquinas e processos, com atuação nos segmentos de geração de energia ( UHE´s e UTE´s ), Açucar & Etanol, Papel & Celulose, ÓIeo & Gás, Siderúrgico e, Máquinas. . Além do conhecimento técnico e, boa bagagem teórica nas áreas afins da Eletro-Eletrônica, Controle, Mecânica, Hidráulica, Termodinâmica entre outras, possui boa experiência de gerenciamento comercial e, boa capacidade de transformação do conhecimento multidisciplinar acumulado em resultados. A rede de relacionamento comercial-técnica é extensa, firme e, em alguns casos, extrapola as fronteiras nacionais. Possui artigos técnicos de autoria própria publicados em mídias tradicionais-especializadas de circulação nacional. Boa familiaridade com normas mais comuns da área, tais como a IEC 61131, Norma SIL ( IEC 61508 ), API, NEMA, IEC 61850, ANSI entre outras. Experiência internacional, através de viagens profissionais para os Estados Unidos, Alemanha, Chile e, Perú. . Outras atividades profissionais incluem: . - Trabalho voluntário ( 4 anos ); . - Sociedade no Grupo TRL ( www.grupotrl.com.br ) - pequeno grupo empresarial do segmento automotivo de Campinas-SP; . - Membro da ISA-Seção Campinas . - Blogueiro Técnico

37 Comentários

  1. Bom trabalho, parabéns. Sou engenheiro mecânico, que trabalhei com automação desde 1983 no entanto no CREA só posso emitir documentos por esta formação básica como engenheiro mecânico. O CREA não reconhece profissionais com pós graduação em especialização em projetos mecatrônicos. As empresas que me procuram atender a todo o complexo industrial, assim indiretamente tomo partido em automação. Vide meu profile no linkedin.com nome Paulo Luporini Pastore. Tenho duas equipes de montadores uma para usinas de alcool e açucar, e uma outra para usinas hidrelétricas que estão no mercado há mais de 20 anos.

    • João José Marques Gonçalves no

      Ronaldo,
      Parabéns pela iniciativa de apresentar este artigo e criar uma possibilidade de debate sobre este tema.
      Você poderia explicar a justificativa da Woodward para usar a ação derivativa no controle de velocidade de turbinas a vapor ? Em geral, todos os concorrentes da Woodward somente usam as ações proporcional e integral. Como você observou bem no seu artigo, usando apenas a ação proporcional teríamos a operação no modo droop. Adicionando a ação integral, eliminamos o erro estático do regulador P e teríamos a operação em modo isócrono. Você acha que realmente se justifica usar a a ação derivativa que você chamou de “compensação do atuador” ?
      joao.jose@jjmg.eng.br

      • Bom dia JJ ! Espero que esteja tudo bem contigo… Vamos lá: De fato, o emprego da ação proporcional e, ação integral são suficientes na maioria dos casos para atingimento dos resultados esperados elencados nesse artigo e, como demonstrados na Figura 9. Ocorre que a Woodward disponibiliza como um DIFERENCIAL ao usuário a possibilidade de ajuste da ação derivativa. Ela se justifica em algumas situações em que a resposta do controle, logo após a execução da ação integral, por algum motivo esteja um pouco lenta. Ao ajustar a ação derivativa, é criado um “amortecimento” ( antes do erro ) que irá contribuir para a ação integral ( depois do erro ) “resetar” mais rapidamente e, trazer o controle para o Set Point ajustado. Obviamente, isso deve ser feito com bastante cautela e, em casos específicos, de modo a não prejudicar uma resposta rápida requerida para esse tipo de aplicação, mas de fato, como já explanado e, demonstrado na Figura 9, na maioria dos casos, o ajuste da ação proporcional e, ação integral é suficiente. Um abraço e, obrigado por apreciar o artigo. Ronaldo – ronaldo-jsilva@bol.com.br

  2. Marcos Vega no

    Caro,
    O artigo é sumamente importante em termos mecânicos e controle, porem as Moendas podem estar em fase de serem substituídas por Difusores, devido ao custo/beneficio, manutenção e rendimento.
    A Moenda é um lugar de muitos ruídos, na qual instalar um protocolo Fieldbus Fundation, seria grave, devido justamente a alto índice de ruídos e outros.
    As novas Usinas a serem montadas com certeza deverão ser com Difusor por N motivos e já temos varias Usinas com este tipo de moagem.

  3. Boa noite Marcos ! Eu entendo e, respeito vossa opinião, no entanto, prefiro não entrar muito nesse mérito, pois já ouvi N opiniões contra e, a favor do difusor e/ou moenda… Além do mais, mesmo o bom difusor sempre tem uma moenda de secagem no final e, o preparo de cana antes é obrigatório mesmo no difusor. Obrigado pelo seu comentário. Um abraço, Ronaldo.

  4. Max Namar Gonçalves no

    gostei muito do seu artigo, muito bem explicado, trabalho em usina de álcool e açúcar na manutenção elétrica

  5. Lucas Witzel no

    Artigo excelente, mostrando o quanto a modernização e a busca por equipamentos mais atuais e confiáveis gera rentabilidade no final do processo. Uma pena é ver que temos equipamentos que podem melhorar o rendimento e a eficiência final,mas a cultura usineira em gestão da Automação ainda fica com um pé atras, pensando no gasto e não no que o equipamento pode oferecer de confiança e atualização também do corpo técnico.

  6. Ótima matéria Ronaldo, sou tecnico em automação na usina Coruripe açúcar e álcool, e esta matéria vem de encontro com nossas necessidades de estar sempre aperfeiçoando e aplicando novos refinamentos nos sistemas de controle como forma de acumular resultados.
    Parabéns!.

  7. marcos roberto floriano no

    gostei muito do artigo, mas gostaria de saber se o mesmo equipamento seria de bom resultado se a turbina estivesse acoplada a um gerador, obrigado e parabens!!!!!

  8. Caro Marcos, obrigado por apreciar o artigo. Respondendo sua pergunta, se o resultado seria bom se no eixo da turbina houvesse um gerador, o resultado não seria bom, SERIA FANTÁSTICO, há centenas de exemplos maravilhosamente bem sucedidos no Brasil em caso de geradores para os mesmos equipamentos citados neste artigo ! Abraço, Ronaldo – ronaldo-jsilva@bol.com.br

  9. Parabéns, Ronaldo. Muito Bom seu artigo. a aplicação da Turbina com Gerador é muito utilizado também na área de Produção de Gases Industriais e o resultado é maravilhoso.
    Abraço

  10. William Roberto Andrade no

    Muito bom Ronaldo, realmente quem trabalha com estes sistemas de controles seja o integrador, fabricante ou cliente sabe dos benefícios que a automação pode trazer para o cliente final e porque não para o meio ambiente também. Com pequenas economias ali ou aqui no sistema, no final todos acabam ganhando.

    Eng. William
    Will Controle – Campinas – SP

  11. Ronaldo, Muito boa a sua colocação, a mais de 10 ano trabalho com extração do caldo e automação de moenda e só agora um vi um controle perfeitos das turbinas com as placas 2301 DST.

  12. Luiz Paulo no

    Parabéns pelo artigo Ronaldo. Foi muito sucinto e esclarecedor. Sou formado técnico em Mecatrônica com especialização em instrumentação e faz uma semana que estou ingressando na área e absorvendo todos os artigos que possam me dar um norte em relação a sistemas de controle de carga para processos de geração e cogeração de energia. Thanks

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