Com o fim do ano se aproximando, este é o momento de, mais uma vez, avaliar como as tendências e desafios de 2023 poderão mudar ou permanecer no ano novo. Em 2023, empresas de todos os setores continuaram enfrentando a incerteza da história recente, enquanto olhavam para um futuro de grande potencial.
As inovações do mercado incluíram o crescimento contínuo de produtos inteligentes e conectados em diferentes setores, com as empresas procurando melhorar a funcionalidade e a experiência do usuário por meio de software e eletrônica, além do interesse crescente em fontes de energia limpa.
Os desafios relacionados à gestão da cadeia de suprimentos, dinâmica da força de trabalho e inovação sustentável aumentaram a incerteza em 2023, mas também ofereceram oportunidades importantes de inovação e soluções criativas.
Tendências como estas nos setores em geral são relativamente estáveis e, com isso, os desafios enfrentados pelas empresas neste ano são praticamente os mesmos de antes. Isso não quer dizer que nada mudou. Existem diferenças em relação ao ano anterior e, por mais sutis que sejam, terão grandes impactos nas indústrias e empresas no próximo ano.
Para 2024, vejo essas tendências como o nível de pressão que cada tendência exerce sobre as indústrias conforme indicado nos medidores (Figura 2). Com isso, podemos examinar cada tendência em relação às outras e avaliar como ela mudou nos últimos doze meses.
Cinco medidores de pressão
Considerando este conjunto de medidores – um para cada tendência ou desafio – podemos pensar em como as marcações desses manômetros mudarão de 2023 para 2024 e o que pode estar impulsionando cada mudança na pressão:
1) Força de trabalho (em alta): Os desafios relacionados à força de trabalho em alta não só continuaram em 2023, como também se tornarão mais intensos em 2024. A onda de aposentados continua, causando uma falta grave de engenheiros de sistemas, elétricos e eletrônicos. A próxima geração de engenheiros e técnicos vai chegar ao setor com muito talento e paixão, mas não com rapidez suficiente para reforçar equipes que necessitam de recursos. O resultado é que indústrias de todos os tipos enfrentam escassez em funções importantes, da engenharia à manufatura e em outras áreas, forçando as empresas a encontrar novos métodos para substituir o talento e a experiência dos que saem por uma mistura de novos talentos e novas tecnologias.
2) Sustentabilidade (em alta): As empresas estão respondendo a múltiplos incentivos e forças que levam a indústria para um futuro mais sustentável. Estas forças incluem novas regulamentações, novas oportunidades de negócio e a capacidade de impulsionar mudanças sociais e estabelecer posições de liderança na indústria em operações de menor impacto ambiental. No futuro, a pressão continuará aumentando para que as empresas tomem medidas sobre a mudança climática e melhorem a sustentabilidade geral das suas operações. Os que não fizerem isso enfrentarão penalidades significativas, seja de vários níveis do governo, ou com perda de negócios ou imagem manchada de sua marca.
3) Ritmo da inovação (sem alteração): A tendência de aceleração dos ciclos de inovação em muitos setores não é recente e não deve mudar em 2024, pois as empresas enfrentam ciclos de desenvolvimento mais rápidos e um impulso constante para inovar e se manter à frente da concorrência. Embora esta pressão seja elevada em relação às outras pressões, ela permanecerá praticamente a mesma de 2023 no ano novo.
4) Custos (em alta): Tudo está mais caro em todos os níveis da cadeia de suprimentos. Os produtores enfrentam aumento no custo de mão de obra e materiais. Com isso, tudo está ficando mais caro para o consumidor, o que reduz simultaneamente a vontade e a capacidade do consumidor de suportar aumentos de custos adicionais. O resultado é que as empresas não conseguem aumentar os preços para compensar o aumento dos custos e devem, portanto, procurar aumentar a eficiência para gerenciar os custos e manter as suas margens operacionais.
5) Cadeia de suprimentos (em baixa): As pressões da cadeia de suprimentos diminuíram, principalmente com a recuperação da produção de chips de silício. Mesmo com a queda deste medidor, as empresas devem permanecer vigilantes sobre a próxima crise. Não se sabe quando ou onde ela ocorrerá, como vimos claramente com a pandemia da COVID-19.
Como as empresas se preparam para enfrentar os desafios do futuro? É fundamental olhar além das oscilações imediatas nas pressões industriais e adotar uma estratégia para que se tornem mais resilientes, ágeis e adaptáveis para o futuro. A melhor maneira de fazer isso é por meio da transformação digital. A transformação digital permite que as empresas gerenciem seus negócios tanto no mundo real quanto no digital. Esta combinação do real e digital fornece um recurso fundamental: os dados. A união desses dois mundos permite o fluxo de dados entre todos os grupos envolvidos no desenvolvimento de um produto ou no próprio processo de produção.
Cada empresa gera muitos dados. A diferença real ficará clara em breve entre as empresas que simplesmente buscam conectar dados anteriormente isolados e aquelas que se esforçam para colocar esses dados em uso, criando insights mais profundos e gerando valor para o negócio. Isso permite que as empresas busquem níveis mais elevados de maturidade em sua transformação digital, possibilitando capacidades ainda mais fortes.
Uma abordagem holística à digitalização
O sucesso de um programa de transformação digital depende de mais coisas do que apenas ferramentas e tecnologias, é claro. As ferramentas e tecnologias são essenciais, mas a forma como estas ferramentas são implementadas, como as pessoas dentro de uma empresa reagem às mudanças e como os processos ao redor são adaptados para ajudar os profissionais a utilizar a tecnologia são igualmente essenciais na realização de melhorias.
Durante a pandemia da COVID-19, vimos empresas reagirem a uma crise súbita e inesperada, comprando novas ferramentas que provavelmente não eram necessárias e se desfazendo de outras ferramentas que provavelmente poderiam ter utilizado. E pior ainda, muitas dessas empresas nunca investiram tempo ou esforço para entender suas novas ferramentas ou determinar como os processos precisavam ser atualizados para nivelar a curva de aprendizado e extrair o maior valor possível de cada ferramenta.
De fato, é importante considerar todos estes aspectos para atingir o potencial máximo da transformação digital. Assim que for identificada uma nova ferramenta capaz de impulsionar a transformação em um processo, o processo precisa ser otimizado ou redefinido para aproveitar as vantagens dessa ferramenta, e os usuários precisam ser treinados para aproveitar de forma efetiva essa ferramenta e o novo processo com apoio contínuo enquanto desenvolvem essas competências. Assim, a digitalização se expande por toda a empresa, repetindo esta ação: implementação estratégica de novas ferramentas e processos e treinamento dos usuários para acelerar a adoção. A implementação de uma estratégia de transformação digital desta forma ajudará as empresas a se tornarem mais resilientes, adaptáveis e preparadas para enfrentar as crises e mudanças do futuro.
Como saber se esse processo pode ajudar a implementar novas soluções digitalizadas e obter resultados? Porque eu realizei esse processo na minha carreira. Em uma função anterior, fiz parte de uma equipe que desenvolvia um sistema de piloto automático para uma aeronave comercial. Nosso principal desafio foi projetar e desenvolver esse sistema de piloto automático, evitando o dispendioso processo de testes no ar. Nossa solução foi construir um modelo digital da aeronave, completo com sistemas de voo, propriedades aerodinâmicas, sistemas de controle e muito mais. Em seguida, integramos esse modelo a uma simulação de hardware-in-the-loop com hardware de coleta de dados. Com isso, nossa equipe conduziu a aeronave virtualmente e coletou dados críticos ao longo do percurso, criando um modelo completo da aeronave e concluindo os testes de voo sem nunca sair do solo.
Nosso objetivo inicial era reduzir em 66% o tempo de testes de voo do programa de desenvolvimento do piloto automático. Durante o programa, conseguimos isso e muito mais, concluindo nosso programa de testes com a redução de 85% no tempo de testes de voo. Além disso, com o aprendizado e desenvolvimento contínuos da ferramenta e do processo, pudemos criar um simulador de voo de alta fidelidade que nos permitiu avaliar conceitos e projetos de aeronaves antes que elas existissem fisicamente. Não há dúvida de que isso exigiu imenso esforço e investimento, mas foi também uma abordagem inovadora naquele momento, que resultou em alto retorno do investimento. Hoje, essas abordagens são essenciais para o desenvolvimento de produtos complexos e inteligentes do futuro.
De forma positiva, os parceiros tecnológicos, como a Siemens, podem oferecer soluções muito mais robustas, além de conhecimento tecnológico e experiência com a indústria, para dar início à transformação digital e apoiar as empresas ao longo da sua jornada.
Obviamente que a tecnologia desempenha um papel fundamental na criação de soluções digitalizadas para os desafios do futuro. A inteligência artificial (IA) será fundamental para aumentar a velocidade de processamento e a transferência dos dados, o que permitirá acelerar a avaliação e a inovação de produtos e processos. Hoje, a IA pode ajudar a automatizar tarefas rotineiras, deixando os engenheiros com mais tempo para se concentrarem na solução de desafios de projeto. No futuro próximo, as capacidades da IA serão ainda mais impactantes, pois fornecerão a base para o mais alto nível de maturidade da transformação digital.
Sobre a produção, a convergência da tecnologia da informação e tecnologia operacional (TI/TO) permitirá mais flexibilidade e visibilidade, permitindo que os fabricantes tomem decisões bem fundamentadas por meio da monitoração de processos em tempo real no chão da fábrica. A convergência de TI/TO permite que os gerentes avaliem facilmente o impacto comercial da atividade de manufatura e apoia e incentiva a colaboração entre planejamento, programação e desempenho da fábrica, aumentando a eficiência.
2024 e a jornada da transformação digital
Embora a transformação digital possa ajudar as empresas a enfrentar as pressões mais imediatas que surgirão em 2024, ela pode oferecer muito mais às empresas que constroem um plano para evoluir além da conexão de dados para funções de nível superior, como a automatização da gestão de dados e, por fim, a otimização em circuito fechado de produtos e processos. Na verdade, vejo a transformação digital como uma jornada que inclui cinco marcos principais (Figura 5): configuração, conexão, automação, projeto generativo e otimização em circuito fechado.
Os líderes da transformação digital geralmente ficam presos nas duas primeiras fases deste processo de maturidade. Esses estágios são configuração, ou a mudança de uma estrutura de dados baseada em documento para uma estrutura de dados baseada em modelo, e conexão, que se concentra em romper silos que isolam dados baseados em modelo. Esses dois estágios melhoram consideravelmente a rastreabilidade e a acessibilidade dos dados em toda a organização, ajudando a aumentar a eficiência dos processos, melhorar a flexibilidade da engenharia e aprimorar os resultados mesmo com prazos apertados dos projetos.
Vale a pena comemorar esses benefícios, mas eles são insuficientes face às pressões que as empresas continuam enfrentando. Níveis mais elevados de maturidade na transformação digital fazem mais do que processar os dados de uma empresa; eles empregam tecnologias avançadas para usar esses dados como um multiplicador de forças para engenheiros, planejadores industriais, técnicos e outros profissionais.
O terceiro nível envolve a automatização de tarefas, começando pelas tarefas rotineiras e progredindo para operações cada vez mais complexas que, até agora, apenas os agentes humanos eram capazes de realizar. Estas formas superiores de automação vão usar a IA para transformar a engenharia e outros processos. O papel da IA continuará crescendo ao longo da jornada da transformação digital. O quarto nível, projeto generativo, aproveita ainda mais as capacidades da IA para gerar projetos de produtos, processos de manufatura e outros artefatos alinhados ao histórico de projetos de uma empresa e baseados nas informações dos usuários.
Neste contexto, o projeto generativo é usado para se referir a um conjunto mais amplo de capacidades do que aquelas disponíveis atualmente em pacotes de software. Em vez de otimizar a geometria física de um único componente, o projeto generativo baseado em IA pode ser usado em vários domínios para integrar conjuntos variados de requisitos e otimizar o desempenho no nível do sistema. Isso certamente começará com subsistemas antes de avançar para a geração de um produto avançado completo entre domínios.
A etapa final implementa esta tecnologia de projeto generativo em um processo de circuito fechado de geração, avaliação, iteração e seleção de um projeto otimizado. A IA vai gerar milhares de projetos para um produto ou sistema, avaliar esses projetos em relação a vários requisitos e selecionar o projeto ou os projetos com o melhor desempenho. Essas seleções seriam revisadas por uma equipe de engenheiros humanos para garantir a qualidade e fazer a seleção final para aperfeiçoamento e, por fim, produção. Essas capacidades permitirão que equipes de dezenas de engenheiros alcancem o que antes exigiria centenas ou milhares de trabalhadores.
Reiterando, a maturidade digital é um processo que as empresas devem iniciar com um plano e uma perspectiva de longo prazo. Os detalhes desta jornada variam de empresa para empresa e a superação dos desafios do dia-a-dia exigirá agilidade e parcerias fortes em todo o ecossistema industrial. As empresas que abraçarem esta jornada não só vão superar os desafios e pressões de 2024, como também sairão à frente da concorrência enquanto avançam de forma mais rápida e eficiente e constroem produtos e processos avançados e inteligentes.
Artigo escrito por Dale Tutt, vice-presidente de estratégias da indústria da Siemens Digital Industries Software.